quinta-feira, dezembro 28, 2006

Viagem

Sento-me no pequeno banco, um orgulho enorme instala-se no meu peito, como é fantástico depois de tantos anos voltar a esta cidade que me viu nascer, voltar desta forma…
Aliso a barba olhando-me ao espelho, lá fora tudo parece uma revolução. Várias vozes gritam sem parar, sinto que para lá da minha porta cresce uma excitação sem controlo.
Apuro o ouvido, procuro perceber o que aquela multidão excitada diz.
Gritam o meu nome.
Visto as calças de cabedal, procuro organizar o meu pensamento, não consigo…
Já não sou eu que governo o meu corpo, corre lado a lado com o meu sangue um ácido que domina, é ele que me governa agora. Graças a ele vou transportar aquelas pessoas, vou dar-lhes o que vieram aqui buscar, vou servir-lhes sensações, vou colá-las a mim e voaremos juntos para um estado mais puro. Vão chorar, sorrir, talvez se sintam inspirados, talvez se arrepiem…
Sei quem sou, sei qual é a minha missão, sei como fazer, venham beijar-me a mão pois esta noite vou consumir-vos enquanto sou consumido.
Estalam luzes, observo as primeiras caras perto das grades, o meu nome é gritado estridentemente, atiro um “boa noite”, a música logo de seguida contamina todos.
Sinto-me entrar numa viagem que tão bem conheço mas que nunca é igual.
Salto para o meio deles, a meio desabotoada camisa é agora cobiça de muitos, toco em várias mãos, sinto o som subir atrás de mim.
Claramente este público é diferente a excitação é diferente, ou será que sou eu neste local especial que estou a dar algo diferente?
Volto a subir para o palco, paro a musica, paro tudo. Estou a chorar.
Fico quieto, observo aquela moldura humana, milhares gritam loucamente, alguns choram comigo, ajoelho-me.
Procuro tapar o rosto agora coberto de lágrimas, digo-lhes porque que me sinto pequeno perante tal espectáculo, digo-lhes que sou apenas mais um factor de entretenimento, que não tarda o tempo vai devorar-me.
Eles começam a cantar, cantam a minha música a uma só voz, cortam com o silêncio e sem qualquer instrumento oferecem-me uma melodia que nasceu dentro de mim.
Um a um os elementos da minha banda começam a tocar, arranco o micro do suporte e salto, salto o mais que posso!
Volto a ser leão, danço comigo próprio cantando, chego perto das grades beijo agora todos os que posso, arranco a camisa atirando-a longe, sinto que não sou humano, sinto que esta viagem é única.
Arranco para mais uma canção, parece-me que todo o mundo tem os olhos em mim, sou todo convulsões, sou todo espasmos, adrenalina corre em nós todos, o publico está perdido de entusiasmo, todos dançam, todos cantam, quase todos fumam…
Outra canção, e mais outra, esta viagem não pode parar, agarro na guitarra atiro-a para o público, descalço as botas atiro-as também, o som por trás de mim enlouquece-me, sim, devo estar louco mas esta viagem não pode parar!
Algumas pessoas despem-se também enquanto dançam, eu deixei de cantar apenas danço, a banda lá a trás toca desalmadamente, ao som daquela música inebriante todos dançamos, estamos unidos por qualquer coisa que não sei explicar, eu e o meu público somos um só.
Corro pelo palco, agora giro em volta de mim mesmo, procuro girar cada vez mais depressa, aquele som intenso toca cada vez mais depressa, mais depressa, mais depressa...
Caio estrondosamente no palco, perco os sentidos, o público estanca, o silêncio senta-se no trono.
A viagem não pode parar…

terça-feira, dezembro 19, 2006

Neve

Chego cansado perto do riacho.
Ajoelho-me, lavo a cara destruindo o meu reflexo, também eu me sinto destruído.
Deixei tudo para trás, caminho há mais de sete dias, mais sete estou na fronteira…
Quando sinto vontade de desistir, quando o frio é tanto que me impede de pensar, quando a fome me deixa tonto, é o calor da tua cama que me faz caminhar, é a esperança de um dia melhor para nós que me fortalece os músculos.
Às vezes parece-me que falas comigo, consigo ouvir a tua voz na minha cabeça, nem sempre percebo o que dizes, mas sei que me estás a dar força.
Quando procuro dormir para esquecer a fome costumo pensar na tua cara, concentro-me na perfeição dos teus lábios, nos contornos do teu nariz, na pureza dos teus olhos, sorrio sabendo que és tudo o que quero.
Ontem de noite ouvi um tiro, devia ser um qualquer caçador, o meu sangue gelou, pensei que não mais te iria ver, depois fiquei em paz, senti dentro de mim que tomei a decisão certa, a guerra dos outros não era para mim…
A minha guerra era outra, a minha guerra era criar o nosso filho com o amor que temos e com as artes do mundo. Agora não o posso ver a razão da minha vida, não o posso abraçar, quantos anos passarão sem o ver crescer…
Quando ainda as nossas mãos caminhavam juntas no jardim, quando a minha única preocupação era dizer que te amo no dia seguinte, um homem no café perguntou-me o que eu pensava sobre ir para a guerra. Eu disse-lhe que um homem que apenas procura amar e procriar nada faz na guerra. Aliás seria um empecilho.
Um homem que todos os dias dança com os pássaros, um homem que cada vez que beija o filho chora, um homem que esquece o tempo quando contempla a sua mulher nua nada faz no teatro do horror, um homem assim sabe bem o que tem de fazer.
Por isso caminho sem parar, alguns dirão falta de coragem, eu digo que ninguém me manda ceifar o meu irmão, certos caminhos um homem só os deve percorrer se realmente o quiser.
Chove agora intensamente, já não tenho água, tenho bebido uma qualquer nos riachos, sinto que não falta muito para chegar.
Esta manhã vi um homem morto no pinhal, talvez mais um que tentou a sua sorte. Na terra dele irão dizer que desertou que foi um cobarde, eu escrevi na pedra que este homem para não matar, morreu!
Também eu, as vezes tenho medo, tenho medo de não te beijar jamais, mas sei algo que me protege e me dá força para continuar, tu caminhas comigo.
E quando as minhas pernas se recusarem a caminhar, caminharei com as tuas, e se um dia as nossas pernas não conseguirem andar mais tal seja o cansaço, então nessa altura caminharei com as pernas do nosso filho, e essas finas pernas escalam montanhas, atravessam rios, correm dias seguidos se assim tiver de ser.
Como tal, sinto no meu peito que não tarda estarei na fronteira, talvez esta vida ainda nos reserve um belo jantar na nossa casa, onde servirás paz e amor num ambiente de liberdade…

domingo, dezembro 10, 2006

Resposta

- Porque choras?
- Porque te amo.
- È fácil dizer que me amas, explica-me esse amor então!
- Tudo bem. Ouve com atenção.
Corro, corro vorazmente.
Ninguém percebe, porque ninguém quer perceber. Não, não interessa se é comigo que danças, não interessa se é comigo que dormes, não é nada disso.
Não te estou a falar de posse, não vês? Eu não sou o carrasco, eu não sou o patrão o dono.
Eu sou a puta da humildade.
Eu sou a pureza feita mulher, não quero nada. Tudo o que vier até mim terá de ser dado, terá que ser oferecido. Sim falo do teu amor, nada mais.
Quem me oferecer o maior dos presentes, estará a dar-mo, mas no entanto não mo dá porque quer, mas sim porque se sente obrigado a fazê-lo. Sente-se obrigado a fazê-lo porque também ele ama, porque também ele é escravo. E como escravo que é quer dar sem pensar em receber.
Assim como eu.
Mas no entanto tu não lês, és analfabeto, és uma besta.
Tocas-me mas os teus dedos nada compreendem, partilhas comigo o vinho mas não reparas que as minhas faces estão rosadas, reviro os olhos quando vais fundo dentro de mim, mas tu apenas arquejas de prazer.
Danças uma valsa contigo mesmo há vários anos. Sim amigo é verdade, acorda! Nunca estiveste acompanhado, nunca cantaste partilha, nasceste para caminhar sozinho.
Tu já estas apaixonado, não sobra lugar para mim, há muitos anos que amas outra pessoa, uma pessoa que te toma por completo não deixando espaço para ninguém!
Essa pessoa és tu.
Por isso continua essa tua caminhada, espero que demores a encontrar o lago, porque quando o vires irás chorar lágrimas de sangue, nessa altura vais compreender tudo mas aí será tarde demais…
Toma esta foto minha para o resto da tua aventura, guarda-a bem no bolso para quando encontrares o lago, e podes ter a certeza que isso vai acontecer, vais ver nele o teu reflexo, vais ver nele o teu feio retrato, as tuas rugas…
Primeiro chegará a tristeza que te irá consumir como um vulcão, depois subtilmente vai chegar a loucura, nesse momento estarás perdido.
Quando o primeiro laivo de suicídio chegar há tua mente observa a minha foto, mergulha fundo nos meus olhos azuis e contempla…
Desfruta de tudo o que perdeste, desfruta de tudo o que podias ter tido, observa bem o teu amigo a passar na rua pois ele é dono de uma felicidade que te pertence.
Ele vai passar por ti e tu aí farrapo de homem vais ver que ele sorri. É nesse momento que saberás que chegou a hora de pores um fim há tua pobre existência.

Beijo de ódio.

quarta-feira, dezembro 06, 2006

Outono

As folhas castanhas colam-se aos pés, árvores, todas choram, consigo ver bem…
Passa por mim um casal jovem, também eles choram, não sei porquê…
Sozinho deambulo pelo jardim, olho para o astro, tão cinzento, tão enevoado, de certeza que está a chorar…
Não chove, apenas um frio que aquece é minha companhia, aquece-me a alma, traz-me uma réstia de felicidade que não sei de onde nasce.
Sou invadido por uma leve brisa, como cheira bem…
O aroma a terra molhada envolve-me, junta-se a mim na última caminhada, eu sabia que ele se vinha despedir. Sempre para mim foi Rei e Senhor, o mais nobre dos perfumes…
O cheiro da mãe natureza, o cheiro da minha Mãe!
Continuo a caminhar, o pequeno jardim ficou para trás, desbravo por lamas rijas, estou quase lá…
Reparo no velho pomar, ai se pudesse voltar a trás, porque não posso arrancar quarenta anos de vida, como quem rapa um cabelo comprido.
Apenas por um dia, apenas por um dia…
Naquele velho pomar, corri, saltei, cai, chorei, mas principalmente ri! Ri muito, troquei abraços, beijos, palavras de amizade…
Lembras-te filho? Foi aqui que tantas vezes brincámos, foi aqui que te castiguei, foi aqui que selámos uma amizade para todo o sempre, foste sempre bom, sempre amigo da família, irmão que nunca tive.
Foste embora cedo demais…
Chego finalmente, debaixo do velho carvalho estou em casa.
Tive várias casas, vivi em vários lugares, assim a profissão o exigia, mas só aqui me sinto em casa, sempre foi assim…
Sento-me no mocho que há muito estava destinado a ser o meu último trono, olho a paisagem, tudo é castanho, tudo é encarnado, tudo chora…
Lembras-te foi aqui?
Sentei-te neste mesmo mocho, estavas linda como sempre, rias para mim com aquela cara que achava toda a minha panóplia ridícula, mas na realidade amando cada movimento que fazia, afastei-me um pouco para te ver sentada.
Que silhueta, que mulher, com os caracóis ao vento sorrias para mim, mostravas uns sublimes dentes brancos, o teu olhar era inocentemente sedutor, tinhas a sabedoria no rosto, todos te queriam, quiseste-me a mim nunca percebi porquê, aproximei-me outra vez.
Peguei-te na mão, ajoelhei-me, os teus dedos miudinhos pareciam nervosos, sorrias agora ligeiramente, uma lágrima saltou-te do olho, enfiei o anel, estávamos selados para sempre, disseste sim…
Foste embora cedo demais…
Desabotoo-o o velho casaco, uma ligeira brisa sopra mais forte, tiro do bolso a negra pistola, respiro fundo…
Sinto o cano frio encostar debaixo do queixo, nunca pensei que fosse assim…
Mas tenho tantas saudades, sinto tanto a vossa falta…
Uma criança cai no chão.
De repente apercebo-me que uma criança simula, rindo muito, uma queda no chão.
Pum! Mataste-me avô, mataste-me com a tua pistola …
Anda avô! Agora é a minha vez, eu sou o Índio tu és o cowboy…

sábado, dezembro 02, 2006

Encarnado

Quatro da manhã.
Estou no bar do Hotel, um dos melhores da cidade. Dizem que ocupo um dos cargos mais importantes e bem remunerados duma grande multinacional.
È verdade.
Bebo o meu terceiro whisky, não sinto o álcool, nem quero.
Sinto-me em paz, tristíssimo mas em paz, espero tranquilamente que me venham buscar, sim, eles não tardarão.
Estupidamente aos quarenta e sete não vejo qualquer luz ao fundo do túnel, mas também não me importo.
Hoje quando acordei resolvi abrir o livro, disse não ao fácil, cortei com o lugar comum “A vida é mesmo assim” e parti a loiça, parti com quase tudo o que tenho nesta vida de merda!
Não tenho filhos, a minha mulher não pode ter. Sentei-me como sempre a seu lado na cozinha para tomar pequeno-almoço, ainda não a tinha visto, temos quartos separados, há muito que não dormimos juntos, sem me aperceber muito bem porquê o meu casamento transformou-se numa cooperativa.
Ela estava linda, aliás a minha mulher é lindíssima, no entanto viciou-se no status e é o status que lhe serve alegria e tristeza, oferecendo-lhe mais desta última.
Mas acho que é feliz na sua vidinha.
Procurei beija-la, a custo lá me ofereceu fugazmente a face, procurei o contacto não o conseguindo por completo.
- Estás tão mal arranjado, vais trabalhar assim? Perguntou ela.
- Não vou trabalhar. Respondi.
- Sempre foste um farrapo, mas agora estás a bater no fundo. Disse ela indiferente.
- Amor!? Disse eu.
- Como foi a foda ontem com o Barbosa? Deste-lhe o rabinho? deste? Atirei ironicamente.
- Como te atreves! Gritou deixando-me sozinho.
Fui cantando fazer as malas, não voltarei a esta casa.
Já de noite não aguentei estar com os meus pseudo amigos/colegas de trabalho, aquela gente snobe, vazia de valores que sempre me enervou, a sua única alegria é a tristeza dos outros, estava farto daquilo, todas as quintas-feiras o mesmo triste filme…
Ainda estou a ver a cara deles quando tudo aconteceu, não queriam acreditar no que os seus olhos viam, primeiro riram, pensaram que fazia um número para nos divertirmos, mas há medida que a minha peça se desenvolvia, há medida que observavam com mais atenção os meus olhos, percebiam que tudo aquilo era sério.
E era!
Comecei por mandar sair as cinco adolescentes, nuas esfregavam-se naqueles grandes senhores de fato, assustadas apanharam a roupa dando uma ultima snifadela.
Todos riam ainda não percebendo, olhei um a um, metiam-me asco!
Comecei tranquilamente por partir a televisão, tudo na cabeça deles então mudou.
Taças de cocaína, e copos de vinho voaram pelos ares, procurei bater em todos até ser dominado. Uma vez agarrado prometi ficar calmo.
Quando me largaram corri em direcção ao quarto. Abri a porta de repente, uma bela rapariga encontrava-se atada na cama de barriga para baixo, os lençóis cuspiam droga, ela gritava com desespero, um homem devorava-lhe o rabo vorazmente apagando-lhe um cigarro nas costas. Ela não tinha 17 anos…
Caminhei tranquilamente, o meu cérebro era um autêntico vazio, o Barbosa virou-se olhando para mim, acho que ainda falou qualquer coisa, não percebi.
O quarto encheu-se de sangue. Um tiro bastou.
Fiquei ali parado em silêncio contemplando aquele corpo nu pintalgado de sangue, na outra divisão todos gritavam fugindo, não tardou o silêncio reinou.
Virei costas, apetecia-me um whisky.

domingo, novembro 26, 2006

Disco

Olho-me ao espelho, tenho de admitir, tive sorte.
Observo o meu corpo enquanto saboreio o martini tranquilamente, acho-me bonita, o vestido de noite cai-me divinamente, é belo o decote, decididamente tenho sorte.
Sinto o álcool falar-me ao ouvido.
Danço agora freneticamente, vem-me aquela sensação de rainha, sei que emano desejo, sei que transpiro sedução, a pista é claramente minha.
Ao dançar dentro do meu vestido negro sou luxúria feita mulher, os meus cabelos compridos dançam com a musica…
O álcool continua a contar-me segredos, diz-me que sou a mais bela, diz-me que os meus movimentos são terrivelmente sensuais. Tenho sede...
Alguém me agarra quando passo, viro-me assustada, que belo estalou-me na cabeça.
Um homem alto, de olhos claros, largou-me a mão de imediato, tinha estabelecido contacto visual já não precisava do meu pulso.
Era bonito sem dúvida, falou-me ao ouvido algo que não percebi, toquei-lhe no peito levemente aproximando-me para o ouvir melhor, senti por baixo da camisa um corpo duro claramente trabalhado.
Espantada com a minha ousadia recuei, observei melhor a sua excelente silhueta, que perdição de homem pensei.
Ele avançou para mim, hipnotizada vi aquela cara perfeita, aqueles lábios tentadores aproximarem-se dos meus.
Ai… Como sentia vontade de beijar aquela boca, as minhas mãos ansiavam por agarrar aquele tronco, o meu corpo implorava por ser tomado.
Arquejei ligeiramente, os meus lábios abriram-se suavemente na iminência do beijo…
Empurrei-o violentamente.
Virei costas em direcção ao bar.
Carne não é tudo nesta vida, pensei, há quatro anos que conheço o amor, através dele sou um ser maior, graças a ele quero criar e construir, descobri um mundo de paz que desconhecia, não sou mulher de abrir mão dum compromisso.
O dia nascia intensamente.
Introduzi a chave na porta, o meu vestido de seda emanava inúmeros cheiros.
Bati a porta atrás de mim.
Sentei-me no hall de entrada, agradeci a mim mesma o discernimento, disse baixinho – “Estou aqui, voltei! Sinto-me ainda mais apaixonada…
Largando roupa por todo o lado entrei no duche, não queria mais o álcool dentro do meu corpo, já me tinha servido o suficiente esta noite.
Passeio-me nua pela casa, não tenho qualquer sono, Feist toca suavemente.
Sinto um impulso enorme de dizer que o amo.
Reparo agora que alguém deixou um envelope debaixo da minha porta, um pequeno envelope de carta com o meu nome sorri para mim.
Pego-lhe imediatamente.

Margarida.

Sinto uma enorme curiosidade e um medo terrível de não aproveitar tudo o que a vida tem para me dar.
Aos 25 anos percebo melhor qual a sensação de ter pena, arrependimento de não ter feito algo importante.
As vezes penso como é impossível dizer que não, como posso negar a mim mesmo o desfrutar de corpos de diferentes mulheres?
Como posso deixar passar a oportunidade de aproveitar corpos rijos e cheios de juventude que só se oferecem a mim porque também eu sou igualmente jovem?
Terei tempo quando o meu corpo perder um tanto da sua força e beleza de dar exclusividade sexual a uma e uma mulher só.
Não posso assumir mais o nosso compromisso.
Desculpa.

Rodrigo.

domingo, novembro 19, 2006

Chuva

Hoje sou um fantasma.
Não percebo porque? Ninguém olha para mim, as mulheres passam por mim na rua ignorando-me completamente.
Sei que não é dos meus sessenta anos. Nem sempre foi assim!
Sei-o bem, mesmo que não queira admitir hoje sou metade do que fui, a vida levou-me o encanto, a beleza, só me deixou o dinheiro! Esse fiel amigo que curiosamente sempre insistiu em acompanhar comigo, mesmo sem eu fazer muito por isso.
Insiste em acompanhar-me mesmo sabendo que não gosto dele, mesmo sabendo que no fim o odeio, e que principalmente o culpo da sombra que sou hoje.
Sei que foi ele o estratega, sei que foi ele que levou um filho a afastar-se dum pai.
Como estará ele? faz hoje dez anos que não o vejo…
Apenas sei dele pelas outras pessoas, sei que é escritor, sei que escreve na esperança de um dia ver reconhecido o seu trabalho, nunca desde pequeno deu importância ao dinheiro, como o percebo agora… Admiro-o!
Mas não tenho coragem para lhe dizer.
Enquanto vou reflectindo nestas coisas, sinto aquela tristeza que me acompanha instalar-se gradualmente.
Hoje vou ser jovem outra vez, nem que para isso tenha que pedir ajuda ao meu sempre amigo.
Não há nada mais belo que o corpo duma mulher, jovem, cheio, simplesmente sublime!
Ainda enrolado no lençol abraço um charuto, és linda Julia!
Quase fui feliz por momentos, mergulhar naquela jovem desconhecida, beijar aquelas longas pernas, tenha sido uma experiência inesquecível, nunca o fizera antes, que bonita mulher… Ainda assim nunca, nem por um segundo, adormeci a minha dor, nem por um instante consegui calar a minha tristeza.

Deitada, saboreava o seu copo de vinho, ainda sentia o cheiro do seu último cliente.
Júlia desde cedo começou a perceber que despertava nos homens uma reacção diferente. Mesmo ao principio, não percebendo qual.
Preguiçosa, e gostando disso, não foi de estranhar que ainda antes de atingir a idade adulta já ganhava num mês o que os seus pais nunca ganhariam num ano.
Vestiu o seu roupão de cetim, desceu escadas a baixo, eram quatro da tarde.
Enquanto passava perto dum quarto, não pode deixar de ouvir suaves gemidos de prazer, chegando cá em baixo, apenas duas colegas se encontravam sentadas, conversavam nos enormes sofás de veludo.
Voltou para o seu quarto, pensou nele, que falta lhe fazia…
Sabia perfeitamente que estava a cometer um erro, mas não podia evitar, tinha acontecido algo especial quando o conheceu, algo mudara dentro dela, uma estranha admiração por outro ser humano tinha nascido no seu peito.
Até ai, jamais tinha admirado alguém, a não ser ela própria é claro!
Passar aquela semana com ele tinha sido de sonho, ter a oportunidade de vê-lo trabalhar, poder apreciar como vivia, aquilo em que acreditava, como saboreava as coisas simples e principalmente como escrevia, que bela era a maneira como escrevia!
Suspirava agora Júlia, enquanto se espreguiçava na já gasta cama redonda, vaidosa ia se mirando no espelho que se encontrava no tecto, tinha desapertado o roupão, nua, deitada na cama sentia-se adormecer.
Sonhava com o seu escritor…

terça-feira, novembro 14, 2006

Água

Sinto-me acordar levemente, acordo agitado como sempre, não porque tenha dormido mal, mas por uma outra qualquer razão que não sei explicar.
Ainda é cedo, sinto-o.
Viro-me para o lado, tento dormitar mais um pouco. Um agradável cheiro percorre o quarto, raios de sol beijam-me a face, procuro aconchego no corpo nu que dorme comigo.
Quem será?
Toco naquela pele macia, subo e desço com o meu dedo por campos e vales, adoro o seu cheiro a rosas, deve ser bela.
Não me apetece!
Salto da cama, rapidamente visto o roupão, a madrugada dispõe-me bem, entro na cozinha de repente, varias mulheres com fardas ás rendinhas revelam-se constrangidas.
- Bom dia menino.
Apalpo todas, sou brindado com vários gemidinhos envergonhados, mordisco qualquer coisa enquanto saio para a rua.
Olhares reprovadores são meu alimento, agarro no primeiro cavalo, apetece-me voar.
O centeio está bonito, vejo-o passar a grande velocidade, o meu companheiro branco corre vorazmente, ainda é um belo potro como eu.
Algo me faz estancar imediatamente!
Um som que conheço orienta-me, não pode haver canto mais bonito. Procuro não fazer qualquer barulho enquanto desbravo cautelosamente o centeio, passados poucos momentos descubro o que procurava.
A metros de mim, um escravo com não mais de vinte anos, faz amor vorazmente com uma jovem.
Fico encantado!
Dois corpos negros, belos, vibravam em uníssono, de costas para mim aquele corpo musculado de pele brilhante enche de prazer aquela mulata.
Ela revira loucamente os olhos, o seu peito redondo, transpirado, parece querer tocar o céu, é perfeita nos seus pequenos espasmos, os seus gemidos aumentam agora de tom, o corpo daquele homem contorce-se violentamente, poucos minutos restam, gradualmente a paz roubada voltou à ceara.
Regresso silenciosamente.
Os meus cabelos compridos misturam-se com o vento, cavalgo vale a baixo, pequenas flores observam-me, assim como eu, adoram o sol!
Prendo o meu companheiro de viagem no velho carvalho, o roupão cai no chão, encho o peito, respiro com força esticando os braços, procuro abraçar a vida. Nu, mergulho entusiasticamente.
Sou livre!
Fecho os olhos, fico assim a boiar como se não houvesse amanhã, sinto aqui e ali folhas que se colam a mim, irei levá-las para casa, pequenos pássaros que desconheço cantam, o vento sacode tudo emitindo um pequeno som, uma nuvem mistura-se com o sol.
Uma lebre pára na margem, olha para mim.
Fico a olhar aquele animal ali parado, de orelhas espetadas fita-me orgulhosamente, olha para mim com a sabedoria de mil anos, majestosamente parece já saber tudo.
E sabe!
Meneou a cabeça e arrancou velozmente pelo prado, aprecio ternamente a graciosidade do momento talvez um dia também eu saiba tudo…

quinta-feira, novembro 09, 2006

Paris

As pessoas olham para mim na rua, não sei se por causa do meu Pai ser um rico e famoso Conde, se pelo ópio que deambula no meu corpo.
Chego um tanto cambaleante, sento-me na mesa do lado.
O empregado faz-me uma vénia, trata-me pelo nome, não se esquecendo do meu título, pergunta-me se bebo o costume.
Respondo que sim, sem trocar qualquer olhar.
Acendo um cigarro, o meu aspecto é o mais desalinhado possível, tiro do bolso um pedaço de papel amachucado.
Da minha orelha sai um sujo lápis de carvão, chega o meu vinho.
Olho para os desconhecidos que comigo partilham aquele café de luxo no centro de Paris.
Sorrio para eles, imagino que os meus dentes negros não façam sucesso, procuro escrever umas palavras, não me sai nada…
Dói-me a cabeça, penso na falta de coragem das pessoas, penso como se deixam aprisionar, como acabam por viver vidas que nunca quiseram. Eu não sou melhor.
No fundo de mim mesmo, sou o maior crítico, tenho uma voz dentro do meu peito que me devora, felizmente posso adormece-la com algumas garrafas, mas jamais a posso matar…
Ainda bem.
Mais uma taça de vinho.
Júlia entra, sem cerimónias senta-se na minha mesa, cruza as pernas, que belas pernas, que bonito decote, é uma bela mulher!
È minha irmã.
Sorrio levemente, culpo o álcool deste meu pensamento indecente, amo-a, mas não dessa maneira.
Outros animais que não eu, um dia a farão corar. Prefiro não pensar nisso!
Sorrio levemente outra vez, penso que até um porco como eu, que a única coisa que sabe fazer é desrespeitar o seu corpo, procura proteger os que mais ama.
Preparava-se a minha mana, para me dar o chá do costume, quando chega uma bela donzela, impecavelmente vestida. Acenou para a mesa!
Fui apresentado, percebi claramente que o meu cheiro a repugnava. È normal.
Uma bela donzela não deve gostar do cheiro reles de putas. Mas que posso fazer, se é sempre em casas de pecado que durmo as noites...
Claro que a menina de seu nome Margarida, demorou a perceber que tal traste imundo era o irmão mais velho de Júlia.
Resolvi dizer-lhe.
- Menina Margarida jamais vi nesta taberna, que se diz por fina, tão bela mulher.
- Não devia ter dito “bela mulher” mas sim bela menina. Respondeu ela.
- Jamais poderia ter dito bela menina, quando para mim a Margarida é uma bela criação que adoraria provar ainda esta tarde.
Eloquentemente sou brindado com um forte estalo, com a ajuda do tinto, espalho-me ao comprido no chão.
Nasceu em mim o amor…
Elegantemente quanto é permitido a alguém que se encontra totalmente alcolizado, levanto-me, agradeço a prova de amor e beijo-lhe a mão.
Saio porta fora, já nos paralelos sujos simulo uma pequena dança comigo próprio, não valho mais que as pedras da calçada, não estou mais limpo que elas, no entanto invejo-as.
Invejo a sua sabedoria, invejo tudo o que elas já viram, se ao menos me respondessem…

quinta-feira, novembro 02, 2006

Mãos

Sentei-me.
Suspirei…
Servi-me calmamente, o leve aroma de comida invadiu-me, peguei na garrafa.
Levantei o copo, um vinho bastante encarnado, denso, dançou dentro dele.
Todos falavam entusiasticamente, trocavam pequenos pratos, serviam-se de tudo gesticulando.
Sorri…
Ninguém dava por mim, pareciam felizes, diversas conversas misturavam-se na antiga sala de jantar.
No topo da mesa onde me encontrava, ouvia frases misturadas, enroladas umas nas outras, palavras filhas de diferentes conversas chegavam até mim, não percebia o seu sentido, mas guardava-as todas.
Tossi…
Estou nu na praia, uma onda gigante engole-me gradualmente. Foi assim que senti a onda de silêncio que me atacou quando provoquei o pequeno som com a garganta.
Um miúdo loiro de cabelo comprido saltou imediatamente da mesa, prato e copo estalaram no chão, nem olhou para trás, voou para cima de mim beijando-me onde conseguia.
Abracei-o com a força do mundo, mergulhei o meu nariz no seu pescoço, senti aquele cheiro, era a minha cria...
Chorei…
Enquanto abraço a minha vida, sinto um homem forte abraçar-nos aos dois, viro-me para trás, um velho ancião de mãos nodosas e gastas chorava, espetou o seu nariz no meu pescoço, sou a sua cria...
Em seguida partilhámos amor e pão, abraçámos todos...
Estávamos na nossa cidade tranquila.

sexta-feira, outubro 27, 2006

Autopsicografia

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda Gira,
a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Fernando Pessoa.

terça-feira, outubro 24, 2006

Sorriso

Os paralelos, polidos, sujos, eram o espelho de uma Lua envergonhada.
As minhas botas velhas, prendiam-se ao chão…
Caminhava sem destino, eram duas da manhã, ouvia o barulho de vários cafés.
Tinha-me afastado da cidade, o pequeno caminho conduzia-me a uma zona de cultivo, estava muito vento…
Rapidamente os paralelos passaram a terra, não parei de caminhar, continuei absorto em pensamentos vários, estanquei!
O meu avô estava sentado numa pequena rocha, sorria para mim, enquanto eu caminhava para ele num misto de espanto, medo, e alegria.
Abracei-o, ele estava a chorar, sempre fora um homem de choro fácil, como eu.
O meu avô tinha morrido, à mais de dez anos, os últimos já quase totalmente invisual, tinha saudades.
Chorámos os dois, abraçados.
Disse-lhe que estava bem, que era feliz, mas ele já sabia isso tudo…
A paz dançava nos olhos do meu avô, ele estava bonito, talvez até um tanto mais jovem desde a ultima vez que o vira.
Como estava diferente, desde aquele dia, naquela cama de hospital.
Quis dizer-lhe que o amava, que éramos parecidos, que éramos da mesma casta, que infelizmente não pudemos conversar mais. Não era preciso…
Abraçamo-nos mais uma vez, desta vez com mais alegria, partimos cada um para seu lado, sem olhar para trás.
Caminhei tranquilamente para casa, a meio do caminho chorei outra vez, chorei de pura alegria, agradeci aquele fantástico momento, corri, corri muito.
Enquanto corria explanava a minha felicidade rindo e dançando com as árvores.
A lua brilhava agora intensamente, parei para a contemplar.
Acordei!
Acordei, acordei com um belo sorriso, disseste-me tu mais tarde, tinha sido apenas um sonho, um belo sonho…

sábado, outubro 21, 2006

A Gente Vai Continuar

"Tira a mão do queixo, não penses mais nisso
O que lá vai já deu o que tinha a dar
Quem ganhou, ganhou e usou-se disso
Quem perdeu há-de ter mais cartas para dar
E enquanto alguns fazem figura
Outros sucumbem à batota
Chega aonde tu quiseres
Mas goza bem a tua rota
Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada para andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar
Todos nós pagamos por tudo o que usamos
O sistema é antigo e não poupa ninguém, não
Somos todos escravos do que precisamos
Reduz as necessidades se queres passar bem
Que a dependência é uma besta
Que dá cabo do desejo
E a liberdade é uma maluca
Que sabe quanto vale um beijo
Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada para andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar
Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada para andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar"
O Mestre Jorge Palma.

terça-feira, outubro 17, 2006

Rasganço

Rasgam-me, mas não me rasgam as memórias.
Começa a explodir em mim uma vontade de chorar, adeus Coimbra.
Todos riem à minha volta, caras quem nem sempre vi as vezes que gostaria, outras com quem partilhei momentos belos de pura felicidade, raros!
Jamais vos esquecerei, todos!
Oh, obrigado! Cidade mãe que me recebeste tão imberbe e fizeste de mim homem.
Dancei contigo tantas vezes!
Amiga Praça da Republica, soubeste sempre apanhar-me, quando o álcool me empurrou.
Quero hoje mais uma vez beber contigo Coimbra, vamos por uma última vez dançar de mãos dadas, olha, repara, estamos cá todos, todos os teus filhos bebem connosco.
Olha as nossas caras, ninguém quer saber de amanha, hoje somos teus, até deus Baco nos vir buscar.
Quero beijar todos esta noite, corro nu em busca da capa que sempre me embrulhou.
Abracem-me capas negras, gritemos alto, estamos em casa, Coimbra jamais nos faltará.
Aqui nunca me sinto perdido, quanto mais longe estou de ti, mais sinto que te pertenço.
Sei bem que irei chorar muito, enquanto a vida me o permitir, por ti, cidade mãe de toda a saudade.
Sei que o tempo não volta atrás, nem queria que voltasse, basta-me recordar e embrulhar-me na capa negra que nunca me faltou.
Rasgam-me, mas não me rasgam as memórias.

sábado, outubro 14, 2006

Lua

Escrevo sem pressa, afinal ninguém espera por mim, não tenho ninguém…
Gosto de me ir tocando, enquanto fantasio sobre a noite que não me espera, sobre a vida que não vivo.
Agradavelmente húmida, escrevo mais algumas páginas.
Na minha trama, sou sedutora, sou bela, e vivo com uma coragem que não consigo encontrar dentro de mim.
Fora do papel sou frágil, tenho medo.
Gostava de sair porta fora e amar qualquer um!
Gostava de me enroscar num banco de jardim, nua, esperar que um qualquer me possuísse, ali, debaixo da lua.
Corria uma pequena brisa, lá ao fundo ouvia-se o enrolar das ondas.
Empinei o meu rabo, duas gotas escorrem do meu sexo caindo na madeira já gasta do banco de jardim.
Sinto um homem chegar, não lhe vejo a cara, oiço o fecho, sou invadida por um membro quente, bom…
Aqueles movimentos repetidos alimentam-me a alma, enchem-me de prazer, não consigo conter-me, sou toda convulsões.
Grito de prazer, o meu som sobrepõe-se ao som do mar, parece-me agora que o mundo é perfeito.
Tento mudar de posição, quero ver os olhos do meu parceiro de dança, procuro virar a cabeça, mas logo uma mão grossa, suja, calejada, obriga-me a mergulhar no banco de jardim.
Arquejo…
O meu rabo agora ainda mais empinado, expõe uma ratinha rubra, sinto-me exposta como ela, não tenho medo!
O meu dominador, que na realidade é meu escravo, segura agora o meu pescoço enquanto me penetra com alguma violência.
Venho-me uma vez e depois outra, a droga do prazer corre dentro de mim, a minha cabeça não pensa, não pensa nada.
Aqueles movimentos continuam a repetir-se, cada vez mais depressa, cada vez mais loucos.
Um grosso pénis sai agora de dentro de mim, também já não precisava dele, um jorro quente cai-me nas costas, estremeci!
Que faço eu aqui? Quem é este homem? A medo digo-lhe para ir embora, para sair dali, para imediatamente se afastar.
Puxo as minhas calças, ainda envergonhada sinto o homem aceder ao meu pedido.
Já não corre em mim qualquer droga, minha cabeça está agora a mil, volto a ser o que o que sempre fui…
Tenho medo.

quarta-feira, outubro 11, 2006

Flores

Claro que não te dou flores…
Flores acabam por murchar…
Flores a murchar são morte, assim como vidas que se amam um dia vão morrer.
Se ao menos pudesse dar-te flores e com elas toda a terra que as alimenta.
Talvez acreditasse, que também o amor pode continuar depois da morte.
E assim nada temeria.

segunda-feira, outubro 09, 2006

Acordar

Estou farto desta vida
Nem para frente nem para trás
Tudo isto parece uma corrida
Onde não se consegue paz

Será que estou a ser duro
Será que não sei ver
Não será um mundo escuro
Onde ninguém quer perder

Terei eu que lutar
Ou simplesmente ter obediência
Acho que me estou a fartar
Deste mundo de violência

Isto é uma guerra brutal
Sem escrúpulos nem pena
Onde tudo é um matagal
E tu és uma planta pequena.

1996.

Tinha dezasseis anos que saudades…

sábado, outubro 07, 2006

Carla Bruni - quelqu´un m´a dit

Sentei-me, a voz dela dominava o quarto, será possível um homem apaixonar-se apenas por uma voz?
Claro que não, pensei.
Sorvo um café, que maravilha, o cheiro a cafeína é perfeito, os primeiros raios de sol invadem a minha janela.
Ela sai da casa de banho, tão fresquinha, traz apenas umas cuequinhas vermelhas ás pintas, masca uma pastilha, está feliz.
Coloco música e sorrio, de seguida, atiro a chávena janela abaixo, ficamos os dois em silêncio esperando ouvir o estilhaço no passeio. Partiu!
Olhamo-nos e rimos, somos duas crianças, lá no fundo sabemos que somos.
Ela saltou para a cama, começou a saltar na cama loucamente, aumentei o volume, fui saltar também.
Que perfeição, um peito redondo e firme salta, salta muito. Sorrimos.
A vida corre com força dentro de nós, corre-nos bem!
Fazemos dois meses de namoro, amo-a.
Morde o lábio de baixo, adoro, já emoldurei este pequeno movimento milhares de vezes.
O tempo é doce neste quarto, que maravilhoso estado de graça, que paz…
Faço-lhe uma rasteira, ela cai com estrondo no meio de mil almofadas, mergulho no seu corpo, que belo é…
Em menos de nada somos apenas um, no meu ouvido são segredadas parvoíces, rebolamos, lutamos, acariciamos, o tempo pára lá fora.
Sinto-me estremecer, não vou durar muito mais…
Unhas rasgam-me as costas, e então percebo tudo, tudo na minha cabeça faz sentido. Não é o sucesso, não é o dinheiro, nem sequer é a saúde, a vida são momentos, mas isso já eu sabia, não sabia é que a vida primeiro que tudo, é a coisa mais simples, a vida é amor!
Amor, unicamente amor, tão simples…

quinta-feira, outubro 05, 2006

Dançarino

Sou um dançarino, que apenas dança…
Não como, não bebo, acho que nem respiro, apenas danço.
Danço porque amo, sou feio e obtuso, não fui brindado com nada eloquente nesta vida, nunca fui encantador, dificilmente deslumbro, no entanto danço.
Danço porque não sei fazer mais nada, danço porque nasci com uma mais valia que ninguém vê!
Sei dançar!
Ou seja, sei viver!
Tenho esta capacidade de me apaixonar todos os dias, por vezes não reparo nas conversas, por vezes perco dinheiro, chego atrasado. Mas nunca deixo passar uma música que me seduz, se um poema me invade, imediatamente estanco, se o céu está azul eu já o contemplei, nunca é tarde para abraçar um amigo.
Distraio-me pelo meio de conversas, oiço muita gente mas não oiço ninguém, todos me chamam distraído.
Mas como posso ser eu distraído, se quando alguém na minha mesa, ou noutra, fala de amor, fala de encanto, fala das coisas simples, fala do copo de vinho partilhado, fala de laços humanos, eu acordo imediatamente!
Não, não sou distraído, sou bem atento, porque muitos batem na minha porta, e eu realmente não oiço bater, mas quando um qualquer me toca no ferrolho gritando partilha, largo tudo e de imediato estendo a passadeira.
Quando alguém entra na minha casa, e desinteressadamente quer mostrar-me novos mundos, imediatamente me torno seu escravo.
Quando vivo assim sou mais eu.
Vivo para estes momentos, em que a vida me toca.
E então choro, choro naturalmente e sinto-me terra, sinto integrado, sinto que faço parte, e nada me assusta, nem a morte!
Grito então alto, que amo a vida, que ela é feita de coisas belas, que faço parte do todo, não sou mais, não sou menos, simplesmente faço parte.

domingo, outubro 01, 2006

x.

Afinal, éramos tão felizes, porque não vieste dormir ontem, nem antes de ontem.
Já não sei que pensar, sinto tanta falta do teu cheiro, era tão bom falar contigo…Dava por mim a mergulhar nos teus olhos castanhos, transformava-me numa pasta, numa qualquer coisa preguiçosa, e sentia-me bem, sentia-me perfeita.
Quando andava contigo na rua de mãos dadas, sentia-me em casa, aliás tu eras a minha casa. Há três dias que não tenho casa!
Sou uma sem abrigo sem ti.
Espero por ti todas as noites, não tenho dormido na nossa cama, não consigo conceber a ideia de dormir nela sozinha.
Obviamente que a minha barriga não quer comer, já lhe disse que devia alimentar-se, tu não tardas deves chegar, mas ela insiste em não querer nada.
Mas o que mais me assusta, não é a minha barriga, é o que me diz o meu peito.
Tem-me dito coisas que não quero crer, tem-me dito que já não me amas, disse-me que te viu na rua com outra mulher, não posso acreditar…




Afinal, éramos tão felizes, sei que não fui dormir contigo ontem, não fui capaz.
Sinto-me lixo, sinto que não te mereço, não mereço mais as nossas conversas, odeio-me!
Nunca mais vou poder saborear a fundo o teu sorriso, nunca mais vou ser feliz, de certeza que não…
Merda para isto! Sou um fraco, quem me dera agora estar a nadar nos teus olhos azuis, perdi-os para sempre.
Hoje sou metade do que era, hoje o espelho reflecte fraqueza, sou pequeno, sou muito pequeno…
Antes de ontem dormi com outra mulher. Pior, passeei com ela toda a tarde, peguei-lhe na mão e sorri, sou mais um bandalho que não tem palavra, que não tem ideais, que não acredita.
Vendi-me por um corpo, por uma hora de prazer que agora amaldiçoo, troquei o efémero pela perfeição, troquei a nobreza pela vulgaridade.
Não te mereço, resta-me a lama, resta-me esconder-me de ti, pois não sou mais que um cão! Um cão que não se domina, sou o que pior se pode ser, um mísero corpo que se desloca sem propósito.
Perdi o norte, agora resta-me vaguear tristemente…

sexta-feira, setembro 29, 2006

Irmãs

Uma enorme dor de cabeça era sua companhia há vários dias.
Desde cedo conhecera a mão cruel da vida, a irmã mais velha fora violada e morta, os pais, esses, ela nunca vira, restava-lhe apenas a irmãzita mais nova.
Atirou o copo contra a parede, pintou os lábios e saiu, afinal era a vida que tinha, já tinha tentado fugir-lhe mas ela sabia bem, não se pode escapar de um berço arruinado, pode-se fingir por um pouco, tentar esquecer, mas lá no fundo continuamos a ser lixo como se tivéssemos uma doença sem cura.
Eram onze da noite, Flora deslizava por um passeio sujo trocando olhares com todos. O seu andar rebolado chamava atenção, ela era apenas pernas…
Parou um carro, um homem bonito com uma camisa um pouco desabotoada espreitou.
Ela aproximou-se, sorriu, e contrariamente ao seu comportamento habitual entrou antes de perguntar o que quer que fosse.
Ele engolia-a com os olhos, nervoso, parecia escolher palavras.
Flora, tranquila, saboreava o momento, inclinou-se para ele, trincou-lhe a orelha permitindo-lhe observar umas maminhas pequeninas.
Ele ia falar mas ela beijou-o imediatamente, introduziu a sua língua bem fundo, propositadamente fez durar aquele beijo. Ele era lindo…
Em seguida, sem querer, viu o seu reflexo no espelho retrovisor. Viu uma miúda demasiado pintada, uns olhos demasiado tristes, um cabelo demasiado vulgar…
Empurrou o rapaz, bateu com a porta e saiu!
Entrou em casa a correr, a sua colega de quarto chupava um gasto quarentão no sofá da sala, passou por eles com a maior das naturalidades entrando no seu quarto.
Podia agora ouvir a sua colega representar o teatro de sempre, o gordo seboso penetrava aquela miúda de vinte anos pensando que a enchia de prazer, como são ridículos os homens!
Despiu-se, tomou banho, estava agora nua frente ao espelho, contemplava-se.
Era bela, ela sabia-o tão bem…
Entrou na sala, rapidamente aquele homem asqueroso olhou para ela deslumbrado, Flora avançou como numa passerelle, de frente para ele abriu as pernas e sentou-se rapidamente, com a mão direita introduziu aquele membro meio mole na sua gruta ainda seca.
Em seguida beijou a sua amiga que procurava enroscar-se neles.
Começaram uma dança a três, o homem gemia de prazer, estava totalmente fora de si, não queria acreditar no que lhe estava acontecer…
Não demorou muito para que aquele corpo flácido rebenta-se numa fraca ejaculação de prazer.
Os pássaros pararam de cantar lá fora, por momentos pareceu não haver pessoas na rua, o mundo parecia ter congelado por um milésimo de segundo.
Em menos de nada um pequeno punhal perfurou um pescoço, em menos de nada duas jovens loiras e belas ficaram respingadas de sangue, em menos de nada um corpo gordo inerte caiu no chão.
Em menos de nada uma violação foi vingada, em menos de nada duas mulheres que se conheciam desde sempre poderiam dormir em paz.

quarta-feira, setembro 27, 2006

Desabafo

Jamais queiras ser totalmente feliz, jamais te aches corajoso, jamais te consideres totalmente tranquilo.
Procura a clara noção da tua tristeza, e serás feliz.
Repara bem, como és fraco e medroso, e a coragem sempre dançará em ti.
Observa o turbilhão que vai no teu peito, e serás sempre um homem tranquilo.

terça-feira, setembro 26, 2006

Janeiro.

Saiu de casa, o cabelo totalmente desgrenhado. Os olhos raiados de sangue choravam, choravam muito. Ele era personificação do descontrole.
Bateu com a porta, saiu para o passeio, atirou-se para o chão, chorava agora compulsivamente.
A dor que o tinha inundado minutos antes, ruborizava-lhe a face, e principalmente encolerizava-lhe a alma, tinha de se vingar, tinha de ser…
Colocou-se de joelhos, gritava estridentemente, um berro alto e seco espantava todos!
Berrava como louco, um berro descontrolado que não esboçava qualquer palavra.
Aos poucos aquele comportamento ia silenciando a rua. Pessoas estáticas observavam petrificadas.
Começou a bater com as mãos, violentamente, na poça de água, cada vez gritava com mais força!
Então levantou-se, começou andar tranquilamente, já não era a mesma pessoa, nunca mais voltaria a ser.
Naqueles cinco minutos tinha envelhecido, tinha envelhecido nem muito nem pouco, apenas o suficiente para aquele rosto que outrora fora de jovem, hoje ser dum homem maduro, muito maduro.
Cinco minutos, não mais, tinham-lhe roubado o pouco de criança que habitava nele, e com isso o seu impulso de viver, a sua alegria, o seu amor-próprio…
Acordou eram sete da manhã.
Vestiu o seu melhor fato, tinha vários. Os seus imaculados sapatos pretos brilhavam, descia tranquilamente as escadas.
Chovia, chovia intensamente. Apanhou um táxi.
Passado quinze minutos, já entrava suavemente na pastelaria. A sua cara não esboçava qualquer expressão, o seu amigo ao vê-lo sorriu, estendeu-lhe a mão.
A pistola já estava preparada, numa fracção de segundo, uma bala que libertava um pequeno silvo, penetrava o crânio daquele homem que comia tranquilamente.
Saiu a correr, todos na pastelaria, em pânico, mal respiravam…
Apanhou outro táxi.
Chegou ao escritório da mulher, iam fazer uma ano de casamento lá para o verão.
Abriu a porta de repente, ela levantou a cabeça da secretária, não conseguiu ler nada no seu rosto. A pistola em menos de nada apontou!
O cérebro mandou atirar, o indicador não se mexeu.
Ele olhava fixamente aqueles belos olhos azuis, chorava agora de raiva, ajoelhou-se.
A arma ainda apontada, mas o indicador não se mexeu, claramente não se ia mexer.
Atirou a arma contra a parede, gritou, gritou muito, batendo com as mãos no chão…

sábado, setembro 23, 2006

“ O artista é o criador de coisas belas. Revelar a arte e ocultar o artista é o objectivo da arte.”

“Nenhum artista tem simpatias éticas. Uma simpatia ética num artista é um imperdoável maneirismo de estilo.”

“A diversidade de opiniões sobre uma obra de arte mostra que a obra é nova, complexa e vital. Quando os críticos divergem, o artista está de acordo consigo mesmo.”


Oscar Wilde.

quinta-feira, setembro 21, 2006

Filha.

A água está tão fria!
O seu pé pequeno e delicado mergulhou, atrás dele um corpo de criança entrou também, inundou tudo, inundou todo o meu pensamento.
És minha flor disse-lhe de imediato, inundas-me de felicidade.
Atirou-me o seu olhar mais atrevido, dançou para mim, mergulhou para mim.
Enquanto dançava naquela água tão azul, pássaro diversos voavam sobre ela, cantava uma pequena melodia.
Como era bela, como era perfeita!
Senti-me pequeno, senti-me esmagado, aquela pessoa é a minha vida, pensei…
Como é possível…
Deixei de ser dono de mim, já não sou eu que estou ao leme do meu barco, amo-a, é tudo para mim, sinto-o tão forte, tão verdadeiro…
Enchi os pulmões de ar e gritei.
Não vou permitir que chores jamais, jamais verás os podres da vida, o teu mundo será sempre perfeito, vais ser sempre feliz, imensamente feliz, a mais feliz!
- Amo-te papá.
Chorei, chorei de enorme alegria!
Queria esquecer, mas sabia-o bem, a minha princesa não era diferente, iria sofrer ao longo da vida, como todos nós…
Não o consigo imaginar!

terça-feira, setembro 19, 2006

Júlia

Tinha um olho de vidro, pude vê-lo mal a cumprimentei. Procurei disfarçar o meu espanto, ela era deslumbrante, mesmo naquela sala vermelha, com vários sofás de cabedal negro, ela era deslumbrante!
Vestia apenas uma camisa de dormir, já um tanto rota. Por baixo distinguia-se facilmente um peito redondo e farto.
Tinha um ar tão sujo, peguei-lhe na mão e beijei-lhe os dedos.
Olhei a minha volta, que nojo! Gente imunda, agarrava-se a mulheres também imundas, o ar estava carregado de uma lascívia que contaminava todos.
Duas mulheres gordas ocupavam o sofá do fundo, fumavam observando a clientela, mostravam orgulhosamente, grandes seios já descaídos.
È claro que todos reparavam em mim, o meu fato de fino corte não se encaixava no contexto, aliás, eu não me encaixava no contexto.
Júlia olhava para mim com ternura, tinha as pernas cruzadas, duas pernas longas e pálidas, que quase tocavam as minhas.
Nos seus 42 anos, Júlia era uma mulher cansada, de olhar triste, muito triste!
Tinham passado 27 anos, desde a última vês que tínhamos estado juntos. Ela não me reconhecia, claro que não, eu era um miúdo naquela altura. Eu nunca me esqueci dela, era tão bela.
Desde esse dia, corri que nem louco, trabalhei que nem escravo, juntei dinheiro com avareza.
Enganei, roubei, mas nunca matei! Negociei todo o tipo de mercadoria, lidei com todo o tipo de porcaria, não ganhei amor a ninguém, apenas lutei e principalmente suei.
Suei que nem louco!
Primeiro ganhei respeito, e depois chegou o dinheiro, muito dinheiro!
Hoje estou aqui, finalmente estou aqui!
Tinha um ar tão sujo, peguei-lhe na mão e beijei-lhe os dedos.
Mãe estou aqui!
Inevitavelmente comecei a chorar, sabia que ia ser assim.
Amo-te tanto, hoje tudo muda para ti, sou o teu filho, lutei contra os ódios do mundo, fiz-me pedra para te salvar, vamos viver juntos o tempo que nos resta, torna-me humano outra vez.

segunda-feira, setembro 18, 2006

A única desculpa que merece quem faz uma coisa inútil é admira-la intensamente.

Oscar Wilde.

sexta-feira, setembro 15, 2006

...

E assim sou triste, sou a puta da tristeza, mas não me justifico, nem aceito conselhos, pois eu domino!
Não quero as tuas lágrimas, pois eu sou melhor, eu sou vida! Hoje em mi corre fel, corre uma amargura no meu sangue, que contamina e destrói.
Mas eu sou vida! E vou renascer, porque tu não mereces uma lágrima minha, porque tu…, porque tu….
Como te amo, faltam-me as palavras porque te amo, mas sabes que vais morrer dentro de mim, eu sei bem que tu sabes e tens medo.
Tu não me amas, isso, ambos sabemos, mas essa tua vaidade, essa tua vaidade que te possui, que faz de ti um monstro, não me quer perder!
Claro que não quer! Porque essa tua parte negra quer passear-me na rua, ser minha dona, fazer de mim decoração.
Mas tu sabes que eu não sou decoração, eu sou vida!
Corre em mim uma força que conheces, invejas e temes.
Hoje, amanha e depois serei lama, serei farrapo, serei álcool, serei muito álcool.
Mas depois vou acordar, e por entre uma dor de cabeça e um estômago embrulhado, vou ouvir uma voz que diz, ÈS VIDA!
Pois sou.

quinta-feira, setembro 14, 2006

Praia.

Uma gota de suor caiu.
Caiu corpo abaixo, mergulhando no umbigo.
Mergulha em mim amor, sou mar tu és rio.
Sou flor, colhe-me ardentemente.
Sou covil, és serpente.
Misturamos especiarias, bebemos iguarias.
Somos tribais, acasalamos como animais.
Um pouco de sangue, talvez fosse vinho.
Como me perco, serei louca? Talvez.
Abraça-me agora com carinho.
É para ti a minha primeira vez…

quarta-feira, setembro 13, 2006

Ai…

Ai…
Que vontade de voltar a ser o que era, o espelho cospe-me uma imagem que tanto me faz rir como chorar.
Nem sempre foi assim…
Nem sempre fui este homem de traços duros, e pele gasta.
Era belo, aliás, ainda é possível encontrar em mim alguma beleza. Era esclarecido, vivia de peito aberto, amava-te tanto…
Hoje amo-te ainda mais, afinal 50 anos já são alguma coisa, mas já não sou aquele miúdo que te roubava ao mundo, tu linda sorrias, deixavas-te ir! Então eu amava-te uma vez e depois outra e às vezes ainda outra, vibrávamos os dois, afinal, éramos só um…
Obrigado por ainda continuares a meu lado, já choramos tanto os dois…
Acredita meu amor, venero-te, és a minha vida!
Perdoa-me por ter envelhecido, mas acredita, desde que te vi que és minha dona.
Beijo.

terça-feira, setembro 12, 2006

África

Um enorme cansaço é dono de mim. Os meus pés duros e tristes caminharam noite inteira.
Descalço, durante horas fui árvore, não fui mais que isso, uma árvore que anda, que anda sem parar.
A dor caminhava comigo, claro que sim. Mas o que é a dor para mim, não é nada!
O que é a dor de caminhar, para um homem que não vê o seu filho comer há três dias. Ele é tudo o que eu sou, carregarei o meu filho para lá da montanha.
Pode chover, até que a terra seja mar, pode fazer sol e tudo derreter, ainda assim com a força de mil leões, o meu filho verá o doutor.
Nunca fui nada nesta vida, mas sou Rei todos os dias, quando ele me beija.

domingo, setembro 10, 2006

Chuva.

Sou viciado, sei que sou. Por vezes diverte-me este estado de ausência, este estado semilouco, mas ele dura tão pouco, é tão perfeito, tão breve.
Navegava dentro de mim como de costume, o mundo era para mim um misto de cores estranhas, acho que cambaleava quando te vi.
Estavas suja, o teu vestido branco estava completamente negro no fundo, que lindo sorriso!
Rias-te de mim com os teus dentes brancos, estavas sozinha, divertias-te com a forma desconjugada com que eu me deslocava, chovia!
Disse-te tristemente, que há mais de sete anos, todos os dias, me deslocava assim para casa. Então tu, rebentaste num riso descontrolado que durou muito, eu chorei uma lágrima que a chuva levou.
Pensei no passado, pensei na vida, sou um fraco andarilho numa rua de Lisboa, tu és luz, és alegria, és prazer…
Disse-te que eras linda, que eras perfeita, que por ti nasceria outra vez, que por ti não seria mais sombra, disse-te que a meu lado serias a mulher mais feliz!
Tu sorriste ligeiramente, aproximaste-te da minha boca, disseste baixinho, - “Desculpa, mas metes-me nojo.”
Sorri.

sábado, setembro 09, 2006

Sei-o tão bem!

Bebe comigo deste vinho, mesmo não gostando…
Dança comigo esta música, mesmo não sabendo…
Agora fode-me, mesmo eu não querendo…
Viola-me intensamente, penetra-me, mesmo sabendo que não me desejas…
És meu escravo, fico sempre molhada, cada vez que te obrigo a penetrares-me…
Que tesão me dás! O teu membro grosso, belo e delicioso, chupava-o o dia todo se pudesse.
Sangro-te as costas, tu mereces! Gemes agora, enquanto te esvazias dentro de mim, és belo nos teus vinte e cinco anos.
Depois de hoje, não quero mais voltar a ver-te, sei-o tão bem!

Danço...

Danço por campos de papoilas. Nua, sou mais feliz, sou mais eu.
Mil músicas tocam em mim, danço ao sabor de todas elas.
Sou feliz! Sou tão feliz, meu Deus como é possível…
Caminho descalça pela erva, aquele friozinho, é a minha companhia.
Vou sem pressa, vou sem destino, que bela caminhada!
A vida não é nada para mim, eu não sou nada, vivo por viver, não quero destacar-me, sou apenas mais uma formiguinha, sou apenas alguém no meio de milhões, como é bom respirar!
Aqui estou mundo, ama-me! Dança comigo, faz amor comigo, mostra-te, quero ver tudo o que tens para me dar, quero ser tua amante para sempre.
Quero fundir-me contigo, quero morrer um dia com este sorriso nos lábios, embrulhada em ti.

quarta-feira, setembro 06, 2006

Tu sabes...

Tristeza, és perversamente bela, tu sabes…
Em ultimo reduto, estás sempre lá.
Companheira, amiga, mas cruel, estás sempre lá
Odeio-te, mas tu nunca me enganas.
Também tu és infeliz, fazes-me rir…
És bela e infeliz como eu, tu sabes.
Sei que não prestas, mas admiro a tua pureza
Sei que não me amas, mas não te sou indiferente
Sei que queres partir, mas eu obrigo-te mais uma vez a ficar!

segunda-feira, setembro 04, 2006

Sábado

Estava cansado, atirei a minha aliança para o cinzeiro. Finalmente tinha acabado! Fumava tranquilamente, lá fora chovia, o meu chorão, (única arvore que plantei em toda a vida), vergava-se a um vento imponente e demolidor.
Eram quatro da tarde, os filhos do meu vizinho indiferentes ao terrível clima, jogavam futebol gritando constantemente, via-os da minha janela.
Respirei fundo, não estava feliz, embora não soubesse porque. Já tinha bebido uma garrafa de vinho sozinho, todo o meu pensamento estava toldado, sabia-o bem.
Apetecia-me gritar, sair lá para fora nú e gritar! Desafiar o tempo, desafiar os deuses, cuspir nas pessoas, violar mulheres, bater em homens mais fracos que eu.
No entanto nada disso fazia, apenas me embriagava como qualquer paspalho de classe média. Também sabia que não era correcto praticar tais acções, sabia bem que jamais teria coragem para realizar tais inventos, não era da minha natureza ser violento, no entanto esta revolta assaltava-me neste estúpido e solitário sábado à tarde.
A ideia varreu-me o espírito como um relâmpago.
Sem pensar, agarrei o telefone, acertei o preso (cento e cinquenta euros), passado uma hora ela já tocava a campainha.
Sorriu quando lhe abri a porta, fantástica, morena, calçava como mandava a praxe uns horríveis sapatos pretos de salto alto. Lábios perfeitos, grossos, lançaram um sorriso de profissional. Ela ia falar, interrompi-a imediatamente, perguntei-lhe antes que falasse alguma coisa, se teria coragem de atirar os sapatos porta fora.
Sensualmente ela mordeu por momentos o lábio superior, em seguida atirou violentamente os sapatos quase acertando nos miúdos.
Encostou-se imediatamente ao balcão do bar da minha sala, de costas para mim deixou cair uma curta saia ao xadrez, um rabo pequeno mas empinado prendeu o meu olhar, um fio dental cor-de-rosa separava duas nádegas convidativas.
O seu cabelo negro e liso estava apanhado, o rabo-de-cavalo que formava estava preso por um pequeno elástico da cor das cuecas.
Sentia-me a enlouquecer, avancei louco, sem demoras agarrei-lhe o cabelo, forçando-a a encostar a boca no balcão. Resistiu a vergar-se, obriguei-a com violência, dobrou-se sobre si mesma lançando-me as únicas cinco palavras que lhe ouvi.
Quero sentir-te no meu rabo! Disse baixinho.
Ao ouvir isto larguei-a, virei costas e vim sentar-me no sofá, disse-lhe calmamente sorrindo, que quem mandava ali era eu e que não queria que mais abrisse a boca.
De imediato tirou as cuecas, meteu-as na boca, tirou a parte de cima de onde saltaram duas maminhas pequenas e rijas.
Do fundo da minha sala, sentado, ao ver aquela miúda gatinhar para mim de olhos cravados no meu sexo, não pude deixar de pensar como era solitário. Mas logo em seguida pensei que a ia devorar, ela tirou-me as calças e acolheu-me na sua boca, que quente estava!
Escoria-lhe saliva pela boca enquanto chupava lentamente o meu pénis, passados alguns minutos já ambos corríamos a alta velocidade, ela parecia estar a tirar tanto gozo do sexo oral como eu. Devíamos ter praticamente a mesma idade, não devia estar habituada a clientes tão novos.
Não aguentei mais, procurei retirar o meu membro, ela ao aperceber-se do meu acto agarrou-me pela cintura, cravou as unhas no meu rabo e abocanhou-me com força.
Ejaculei! Quente a boca dela acolheu todo o meu sémen, só quando sentiu que tinham terminado todas as minhas convulsões retirou a sua boca, sorriu para mim.
Engoliu tudo na minha frente, vestiu-se, apanhou a minha aliança e saiu porta fora. Deixei-a ir…

quinta-feira, agosto 31, 2006

É tão vermelho o teu sofá!

Sento-me no teu sofá vermelho, tu não estás. É tão vermelho o teu sofá!
Fecho os olhos. És tão morena! Deitada assim nua, encolhes ligeiramente a perna de forma a tapares o teu lindo e viscoso sexo, todo o meu corpo ainda cheira a ele.
Brincas deliciosamente com o teu pé, é tão perfeito.
Agora viras-te de barriga para baixo, sentes o contacto da tua vagina com a já gasta lona vermelha, o teu rabo redondo e empinado abarca toda a largura do sofá, convida-me.
Deito-me sobre ti, o meu membro, ao tocar na tua pele cresce. Com as duas mãos seguro-te o pescoço, começas a mover as tuas ancas, os teus movimentos circulares fazem-nos entrar numa fricção louca, cada vez mais rápido, cada vez mais rápido.
Já em desespero, sem tirar as mãos do teu pescoço procuro encontrar o teu buraquinho. Finalmente consigo, mesmo sem ver a tua cara sinto-te arquejar, já perdida libertas um pequeno e singelo gemido. É bom viver! A frase está a ser cantada em todas as cavidades do meu corpo.
Adoro o teu sofá, mesmo quando tu não estás.

Vício de viver.

Poderá o vício do jogo ser mais destrutivo, que amar uma mulher que não nos quer?
Será que existe algo que nos perturbe mais, que sentir dentro de nós um amor, de tal forma incondicional, de tal forma arrebatador, que nos destrua e nos roube o que temos de mais sólido, a nossa vontade de viver?
Sem duvida, amar loucamente uma mulher que não nos quer, é de longe mais destrutivo que qualquer vício.
Não considero que a ausência da mulher que amamos, mas que nunca tivemos, nos possa roubar a vontade de viver.